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Já é tempo de incentivar, apoiar e aplaudir os líderes sustentáveis que encontramos. Eles representam uma resposta potente para o que precisamos

Desde que nascemos, estamos acostumados a praticar o exercício da paciência. Aprendemos a esperar. Esperamos para sermos amamentados quando ainda não podemos nos alimentar por conta própria, para trocar de fralda, para tomar banho.

Depois de algum tempo de vida, saímos de uma situação de dependência absoluta, para, cada um a seu modo, entrarmos numa dinâmica de interdependência. Já no final da infância, a maioria consegue cuidar de si mesmo, permanecendo vinculado aos outros pela necessidade física, mental e emocional.

Mas mesmo sendo menos dependentes, a necessidade de termos paciência está sempre lá: temos de esperar pela chegada das férias, para se recuperar de uma doença, pelo ônibus que ainda não passou, pela ligação que queremos receber, pela economia do salário para a realização de um sonho material. Esperamos pelos ciclos da natureza para realizar alguns feitos: a chuva para regar a colheita do que plantamos, a noite para o descanso, o verão para o bronzeado. Mais recentemente na história da humanidade, passamos a esperar pelos ventos para a geração de energia, pela extração do silício para a fabricação dos computadores…

O fato é que esperamos, o tempo todo.

E toda a jornada de paciência é útil para aprendermos que, para a realização de certos planos, é importante adiar alguns prazeres imediatos em troca de uma aposta do que queremos que aconteça em algum momento no futuro. É por isso que juntamos dinheiro, passamos filtro solar, educamos nossos filhos, preservamos nossas relações.

Não é diferente no mundo do trabalho. Esperamos pela promoção na carreira, para recebermos o bônus depois de uma boa avaliação, para sermos indicados por clientes e amigos. Esperamos também que a meritocracia funcione numa relação de causa e consequência: plantamos, então, vamos colher. Mas sabemos que nem sempre é assim.

“Apesar de trabalharmos duro em direção aos grandes objetivos, aumentando as chances de eles acontecerem, não temos garantias de que vamos colher o que desejamos simplesmente porque plantamos. Há a dimensão do tempo e de tudo o que acontece entre o ponto inicial e o final. As intempéries acontecem – para o bem e para o mal”

A ansiedade que o ser humano sente surge exatamente quando esse equilíbrio entre a espera e o resultado entra em curto-circuito. Para dar conta dessa distância entre plantar e colher, as organizações criaram sistemas meritocráticos para premiar aqueles que apresentam mais performance, numa tentativa de encurtar essa distância.

Gerou resultado? “Está aqui o seu bônus, o seu aumento, a sua promoção.” Essa foi a resposta que nós, seres humanos, conseguimos dar até agora para o que Freud chamou de “objeto perdido”, aquilo que nos falta desde que nascemos e do qual vamos atrás ao longo da vida. Esse objeto é o que nos move em direção a encurtar a distância entre o plantar e o colher.

No decorrer da vida, transformamos o objeto perdido de Freud em demandas por mais, pela novidade, numa tentativa inconsciente de recuperá-lo. Um carro melhor, uma casa maior, uma roupa mais atual, um almoço num restaurante mais bacana, uma temporada num hotel mais luxuoso, um salário maior, uma promoção profissional.

Da forma como ela está hoje, a meritocracia valoriza que cada um faça o seu e receba a recompensa por isso, incentivando a busca pelo objeto perdido de forma incessante. Iniciativas de longo prazo, que possam ter efeitos eventualmente depois que aquele líder já não estiver mais naquela organização não são valorizadas.

O resultado é que quem paga a conta somos todos nós, inclusive o líder, por meio das respostas que o ecossistema dá a essas ações despreocupadas com o futuro: pessoas mais ansiosas, meio ambiente mais poluído.

Na medida em que ações e resultados de curto prazo são priorizados, a natureza também paga a conta porque emprega-se menos tempo para pensar numa embalagem que usa menos plástico, existe menos preocupação com a cadeia produtiva de um determinado produto, deixando partes dela à beira de um colapso como, por exemplo, observamos na indústria da moda, uma das mais poluidoras do planeta.

“Pouco difundido no Brasil, o termo “liderança sustentável” deveria ser adotado não só no nome, mas nas práticas dos líderes de todo o mundo para dar conta da complexidade do que é exigido das organizações pela sociedade: sustentabilidade“

Mas o que é liderança sustentável? É um termo para definir o líder de empresa que cria estratégias de longo prazo que tenham impacto positivo nas dimensões social, ambiental e financeira – todas elas ao mesmo tempo e não uma em detrimento da outra. Para isso, a liderança precisa estabelecer relações igualmente de longo prazo com diferentes agentes internos e externos para conseguir equilibrar todos os interesses e garantir resultados tangíveis e intangíveis, renunciando a colher tudo o que plantou. Assim como aprendemos a fazer ao longo da vida, são capazes de equilibrar os prazeres imediatos e as conquistas que precisam de paciência para serem vividas, conscientes que o objeto perdido não pode ser recuperado e que a busca por ele, por mais pulsional ou instintiva que seja, pode se tornar uma armadilha.

Sabemos que as organizações – das pequenas às gigantes — têm grande capacidade de transformação econômica, social, cultural e ambiental. São elas que empregam grande parte da população assim como as que usam as matérias-primas vindas da natureza para produzir muito do que consumimos diariamente. Quando uma delas comete um erro, como o rompimento das barragens de minério em Minas Gerais, o estrago é imenso. Da mesma forma, quando decidem se ocupar de causas coletivas e públicas, o benefício é igualmente em grandes proporções, como observamos nas doações e campanhas feitas para controlar a pandemia no Brasil.

Não é à toa que já existem programas de liderança sustentável em grandes universidades do mundo, como no Imperial College Business School, e uma organização exclusivamente criada para líderes sustentáveis, financiada pela União Européia.

Não podemos esquecer que empresas são conduzidas por pessoas. Isso significa que as decisões de uma organização são o resultado da decisão de um ou mais líderes que, por motivos diversos, podem priorizar os efeitos de curto ou longo prazo. Esses líderes, muitas vezes mais comprometidos com suas próprias carreiras e com a busca de seu objetivo perdido e menos com o impacto das suas ações no longo prazo, acabam entrando na lógica da pura meritocracia.

O surgimento de boas práticas ESG, ultimamente levadas muito a sério, é um grande e importante avanço para criar marcos regulatórios que incentivem as práticas sustentáveis relacionadas ao meio ambiente e à sociedade. O problema é que não falamos dos incentivos que estão lá dentro, direcionando a tomada de decisão, no dia a dia, dos líderes. O que observamos, ainda, é um incentivo desproporcionalmente maior para os resultados financeiros e de curto prazo.

Já é tempo de incentivar, apoiar e aplaudir os líderes sustentáveis que encontramos. Eles representam uma resposta potente para o que precisamos. Primeiro, porque eles nos ajudam a entender que nossos objetos perdidos não são recuperáveis – apesar de passarmos toda a vida em busca deles. Segundo, porque trazem uma compreensão do quanto é importante criar mecanismos para que todos, inclusive os próprios líderes, possam criar impactos positivos à sociedade, ao meio ambiente, à empresa em que trabalhamos e a nós mesmos. Se queremos ter gerações liderando nossas empresas no futuro, precisamos ter líderes sustentáveis no presente.