Eco-ansiedade: uma angústia cada vez mais presente no divã cuja solução está nas mãos dos líderes

Guilherme jan 1, 2024

Enquanto cada um vai tentando driblar suas angústias geradas pela ameaça à própria existência, líderes precisam assumir a responsabilidade sobre a saúde do planeta e a dos seres humanos que o habitam

20/03/2023 08h00  

Jovens fazem manifestação cobrando avanços no tema de perdas e danos na COP27. — Foto: Getty Images

A ansiedade é uma das principais causas que levam alguém ao terapeuta. Causada por motivos diversos, quando a ansiedade atinge níveis altos – e por muito tempo – que impedem alguém de manter seus vínculos consigo mesmo, com os outros e com o trabalho, costuma dar sinais de alerta que podem ser percebidos ou não, a depender do nível de auto-observação de cada um.

Médicos, psicanalistas, psicólogos, terapeutas de todas as especialidades e muitos outros profissionais estudam a ansiedade há muito tempo, mas sempre precisam renovar seus estudos já que as causas e os sintomas desse quadro estão sempre conectados com as circunstâncias e o contexto em que vivemos.

Como novo elemento disparador de ansiedade, o tema da mudança climática entra nos consultórios com mais e mais frequência. Isso é o que conta a jornalista Ellen Barry, do New York Times, numa reportagem que descreve alguns casos de pacientes que tiveram seus quadros de ansiedade acionados por uma extrema preocupação com o meio ambiente e, portanto, com a própria existência diante de tantas ameaças climáticas.

Essa ameaça, da qual tomamos maior consciência ao longo dos últimos anos, foi apontada pelo psicanalista francês Jacques Lacan, em sua conferência em Milão, nos anos 70, quando decidiu fazer um “wake up call” aos analistas de todo o mundo para se posicionarem e estarem preparados para o que chamou de efeitos sufocantes provenientes da atuação do ser humano sobre o planeta.

Passados quase 50 anos, o que observo nas sessões individuais e nas discussões coletivas de líderes sobre o seu próprio futuro e o das organizações e da sociedade são manifestações desse sufocamento. Pelo menos uma vez por semana escuto depoimentos tais como “Não sei se conseguimos reverter a situação”, “Não sei se quero ter filhos porque o mundo que a próxima geração terá que enfrentar será cruel”, “Eu não consegui trabalhar essa semana porque estava lendo notícias e aparecem inúmeros casos de catástrofes climáticas que me fizeram pensar sobre a minha existência e sobrevivência”.

Há uma ameaça e ela está interferindo na saúde mental de todos nós. Uma pesquisa global recente publicada pelo Lancet mostra que quase 6 a cada 10 jovens entre 16 e 25 anos estão muito ou extremamente preocupados com as mudanças climáticas. Esses 10mil jovens que vivem na Australia, Brasil, Finlandia, França, India, Nigeria, the Filipinas, Portugal, Reino Unido e Estados Unidos responderam à pesquisa e manifestaram a falta de apoio das lideranças para lidar com tamanha ameaça.

Esses jovens e, ainda, adolescentes e adultos maduros estão procurando ajuda nos consultórios para sua saúde mental diante de tais ameaças já que os efeitos da eco-ansiedade estão afetando o dia a dia de trabalho, as relações sociais e a conexão com os próprios sonhos e objetivos individuais.

Apesar de muitos profissionais da área da saúde mental não se sentirem preparados para tratar clientes com esses sintomas estão surgindo iniciativas diversas ao redor do mundo que ajudam na formação e no condução desses tratamentos.

Uma das publicações mais importantes para lidar com isso é a da psicanalista Anouchka Grose. Seu livro “A Guide to Eco-Anxiety: How to Protect the Planet and Your Mental Heath” (Um Guia para a Eco-Ansiedade: Como Proteger o Planeta e Sua Saúde Mental) é uma referência no tema, trazendo ferramentas e estratégias para diminuir a ansiedade e tomar boas decisões individuais e comunitárias que tragam impacto positivo ao meio ambiente.

Mas não basta cada um buscar sua própria saída para lidar com uma ameaça que é de todos. É também igualmente importante e urgente que líderes empresariais coloquem nas suas listas de prioridade a busca de soluções para que seus serviços ou produtos entreguem à sociedade um valor que se estenda à contribuição ao meio ambiente. É imprescindível que líderes públicos possam sustentar suas posições radicais a favor do planeta mesmo que esses sejam interesses contrários aos da economia. É fundamental que esse tema entre nas discussões e reuniões em nossas casas, nossas empresas, nossos amigos.

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